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Lição #17 – A maravilha de ser café com leite
Tempo de leitura: 7 minutos
Olá, meu nome é Clara e, por algumas reviravoltas inesperadas do destino, hoje eu sou professora de estratégias de negócios, marketing e empreendedorismo para alunos do ensino médio.
É engraçado olhar para trás e pensar que eu tinha tudo para chegar até aqui desde cedo, mas acabei seguindo um caminho um pouco não convencional.
Nesta newsletter, eu vou dividir com vocês o que eu venho aprendendo sobre negócios para poder ensinar os meus alunos de uma forma que traga interesse e aprendizado real.
Neste momento da minha vida, o meu interesse por empreendedorismo não vem de uma vontade pessoal de me tornar CEO da minha própria empresa, mas sim de uma curiosidade em compreender conceitos e mudanças de mercado para poder ensinar algo realmente relevante para meus alunos.
🙋♀️ Presente?

Eu, sendo café com leite no arco e fecha
Lição #17 – A maravilha de ser café com leite
Sabe a expressão “ser café com leite”? É quando você tem licença para ser ruim em algo, justamente porque está só começando. É a sensação boa — e ao mesmo tempo assustadora — de entrar em um jogo sem saber direito as regras, de experimentar algo novo sem a pressão de acertar de primeira.
Foi depois de ler o artigo The Power of Being an Amateur (O poder de ser amador), da Harvard Business Review, que fiquei pensando em como essa ideia de ser “amador” é muito mais poderosa do que parece.
A capacidade de abraçar a inexperiência, a incerteza e o desconforto pode ser a chave para desenvolver criatividade, flexibilidade e até a inovação — qualidades que o futuro do trabalho vai exigir cada vez mais. Ser “café com leite” é experimentar o poder de ser iniciante: entrar em campo com curiosidade, humildade e sem a pressão de ser o melhor.
O pensamento e a prática
😄 Como lembra Margot Cardoso, ao falar sobre repertório e vivências como caminho para a felicidade, Nietzsche dizia que quanto mais experiências acumulamos, mais forças habitam em nós. Quanto mais forças, maior a qualidade do pensamento. Da qualidade do pensamento vêm escolhas melhores. E dessas escolhas vem a satisfação com a vida — a tal felicidade construída, que dura mais que o prazer imediato (Vida Simples).
Esse efeito em cadeia não acontece só com experiência, como também quando nos permitimos ser principiantes. É no desconforto que o cérebro encontra espaço para se expandir.
E para provar que ser iniciante pode trazer benefícios concretos, a Débora Jardim dedica seu perfil no Instagram a falar justamente sobre hobbies e atividades que podemos experimentar. Ela conta que, quando trocou cursos de “aperfeiçoamento pessoal” por hobbies simples, acabou se tornando mais focada e muito menos estressada (veja aqui). No fundo, é isso: abrir espaço para pequenas experiências novas não só ativa a criatividade, como também devolve leveza ao cotidiano.
Mas não é só diversão: existe uma explicação bem sólida para o que acontece com a gente quando nos arriscamos em algo novo.
O que diz a ciência
🧠 Pesquisadores como Norman Doidge, no livro O cérebro que se transforma, mostram que o cérebro é capaz de se reorganizar ao longo da vida — é a chamada neuroplasticidade. Quando nos colocamos em situações de principiante, sem nenhum “manual interno” para apoiar, ativamos áreas ligadas à memória, à atenção e à criatividade.
Estudos também indicam que atividades novas e complexas desencadeiam a liberação de dopamina, neurotransmissor que fortalece essas conexões e aumenta a flexibilidade cognitiva (Kleim & Jones, 2008).
Ou seja: o desconforto de ser amador não é obstáculo. É combustível.
👉 Para quem quiser mergulhar mais fundo:
Norman Doidge – O cérebro que se transforma (2007, Editora Record).
Kleim & Jones – Princípios da plasticidade neural dependente da experiência (2008, Journal of Speech, Language, and Hearing Research).
Empreendedorismo: o campo dos iniciantes
Empreender, no fundo, é assumir a condição permanente de amador. É começar algo que não existia, testar hipóteses, aprender com os erros, corrigir e tentar de novo. Nenhum empreendedor começa sabendo todas as respostas — e é justamente essa abertura que cria espaço para a inovação acontecer.
Ao aceitar o papel de iniciante, o empreendedor cultiva a curiosidade e a coragem de experimentar, mesmo sem garantias. Essa mentalidade é o que diferencia quem apenas repete modelos prontos de quem realmente cria algo novo.
O relatório sobre o futuro do trabalho 2025 do World Economic Forum reforça: até 2030, quase 40% das habilidades precisarão ser atualizadas, e as mais valorizadas serão justamente criatividade, curiosidade, flexibilidade e aprendizado contínuo — as mesmas que florescem quando alguém se permite ser “café com leite”.
Inovação é humana
A gente fala tanto de inovação que às vezes parece sinônimo de tecnologia, startup ou inteligência artificial. No entanto, como lembra o artigo Inovar, um ato essencialmente humano da Fourge, inovar vai muito além da tecnologia: é um movimento profundamente humano, de olhar para um processo de outro jeito, imaginar um produto que ainda não existe ou reinventar a forma como nos relacionamos com o mundo.
Quando foi que inovação virou sinônimo de tecnologia, se, pra criar algo, precisamos de habilidades e capacidades que são de gente?
Inovação, no fundo, é assumir que não sabemos todas as respostas — e, mesmo assim, topar a aventura de procurar. É estar disposto a ser iniciante, a errar, a refazer. Porque, sem essa abertura, não existe espaço para o novo nascer.
Um convite para você
E você, quando foi a última vez que se deu a licença de ser café com leite em alguma coisa? Qual hobby, experiência ou aventura você toparia começar agora, mesmo sabendo que vai sair torto no início?
Eu começo! Essa semana fiz uma aula de arco e flecha no dia do meu aniversário e descobri que meu olho esquerdo é o dominante. Eu tenho que me forçar a deixá-lo aberto porque senão, passo longe do alvo 🎯
👉 Conta lá nos comentários do post — quero montar uma lista coletiva de ideias para a gente se inspirar juntos!
Até a próxima,
Prof. Clara!
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🍎 Como usar na sala de aula

Nesta semana, propus uma atividade avaliativa pouco convencional para meus alunos de empreendedorismo: em apenas 1h30, eles teriam que criar um cartão de aniversário com um elemento 3D.
Antes de começarem, mostrei alguns slides explicando da proposta: expliquei o conceito de neuroplasticidade, trouxe dados do Relatório do futuro do trabalho 2025 do World Economic Forum (40% das habilidades precisarão ser atualizadas até 2030, e criatividade, curiosidade e flexibilidade estarão no topo), e conectei com a ideia de que ser amador mantém nossa mente aberta e evita cair na armadilha do pensamento “engessado”.
Eu confesso que esperava resistência — afinal, pedir para adolescentes largarem as telas e construírem algo manualmente soa quase como provocação. Porém, foi o contrário: eles encararam como um desafio real. Claro, teve frustração, choro e até quem dissesse que foi pior do que prova de cálculo. Mas ninguém desistiu.
E como avaliar um trabalho destes?
Expliquei a eles que a nota não viria de “saber fazer artesanato”, contudo da forma como conseguiram traduzir princípios de design no cartão: equilíbrio, clareza, criatividade e funcionalidade. O cartão era só o meio; o que estava em jogo era a capacidade de transformar ideia em forma — um treino de empreendedorismo na prática.
Foi justamente aí que o valor apareceu: obrigá-los a se expor ao novo, experimentar, errar e ajustar. Um exercício prático de mentalidade de iniciante — e, ao mesmo tempo, uma forma de avaliação autêntica.
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