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Lição #18 – Estudo de Caso: a experiência no treino da Hip Hop Workout Collective

Um estudo de caso sobre como transformar cultura em consumo e uma atividade de sala de aula que conecta teoria, prática e propósito.Tempo de leitura: 8 minutos

Olá, meu nome é Clara e, por algumas reviravoltas inesperadas do destino, hoje eu sou professora de estratégias de negócios, marketing e empreendedorismo para alunos do ensino médio.

É engraçado olhar para trás e pensar que eu tinha tudo para chegar até aqui desde cedo, mas acabei seguindo um caminho um pouco não convencional.

Nesta newsletter, eu vou dividir com vocês o que eu venho aprendendo sobre negócios para poder ensinar os meus alunos de uma forma que traga interesse e aprendizado real.

Neste momento da minha vida, o meu interesse por empreendedorismo não vem de uma vontade pessoal de me tornar CEO da minha própria empresa, mas sim de uma curiosidade em compreender conceitos e mudanças de mercado para poder ensinar algo realmente relevante para meus alunos.

🙋‍♀️ Presente?

Lição #18 – Estudo de Caso: a experiência no evento da Hip Hop Workout Collective 

Às vezes até eu me impressiono com o fato de já ter sentado 18 vezes neste ano para escrever esta newsletter. Caso você me perguntasse em janeiro se eu teria disciplina para manter esse compromisso, eu teria rido. E, no entanto, aqui estou. Uma coisa que aprendi nesse processo é que, para escrever coisas interessantes, é preciso viver coisas interessantes. Como disse Charlie Sheen em uma entrevista: “Minha vida não foi um tédio, então meu livro também não é”.

Inspirada por isto, e pela minha vontade de me colocar em situações de “café com leite” (não entendeu? Volte para a edição passada), decidi começar uma série de estudos de caso, em que vou trazer experiências reais, negócios criativos e gente que está inovando. O primeiro é sobre algo que me chamou a atenção no Instagram e que eu estava insistindo em convencer uma amiga há semanas para me fazer companhia: o Hip Hop Workout Collective (HHWO), que se apresenta como o “1º treino aeróbico ritmado com hip hop do Brasil”.

Importante: essa não é uma propaganda disfarçada. Paguei meu ingresso, ninguém me convidou e elas nem sabem que estou escrevendo sobre isso aqui. Trouxe este estudo de caso porque, como professora e pesquisadora de negócios, vi nele um exemplo incrível de como transformar cultura em consumo.

A experiência

Imagine um domingo frio, 9h da manhã, na beira da Represa Guarapiranga, em São Paulo. Chegamos a um restaurante adaptado para receber cerca de 220 mulheres. Digo mulheres porque, olhando ao redor, 96% do público era feminino, majoritariamente mulheres negras. Dois homens tímidos tentavam se esconder no canto, contudo ninguém parecia se importar. Além, claro, de uma infiltrada buscando fazer uma newsletter diferente.

O evento começa pontualmente às 9h20, com a apresentação das três fundadoras: todas mulheres negras, atletas e educadoras físicas, cada uma com trajetória consolidada no mercado de personal training. Esta bagagem é essencial — elas não começaram ontem e já têm uma carreira reconhecida, assim como uma comunidade de alunas que confia nelas. O HHWO amplia essa credibilidade individual, transformando-a em força coletiva. Não à toa, já receberam patrocínio da Nike e foram destaque na mídia, como na revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios.

O aquecimento veio com uma aula especial, a qual muda a cada edição. Justo na minha vez, foi de twerking, com a Bia Graboschi (socorro! eu quase morri tentando acompanhar). Depois seguimos para o treino principal: 50 minutos intensos, cada professora com seu estilo próprio, playlists com hits do hip hop dos anos 2000, elásticos para exercícios, corridas no lugar, agachamentos e até polichinelos.

Cara de: socorro!

O detalhe que transforma: tudo é pensado para ser uma experiência coletiva. O DJ Pink! acerta no tom, a organização distribui frutas, bebidas e brindes, e ainda abre espaço para pequenos empreendedores negros — desde nutricionistas, a aulas de inglês e trancistas — para divulgarem seus serviços e realizarem sorteios. Não é só treino, é uma manhã inteira de pertencimento.

Por que funciona?

Do ponto de vista de negócios, algumas coisas chamam a atenção:

  • Público bem definido: mulheres negras, jovens e adultas, em busca de saúde, autoestima e diversão em um espaço seguro. Este recorte claro cria identificação imediata.

  • Modelo enxuto: eventos quinzenais em locais alugados conforme a demanda. Custos variáveis reduzem o risco. As receitas vêm da venda de ingressos (paguei R$ 69,90) e de parcerias com marcas.

  • Marca forte: as fundadoras já têm reputação consolidada como personal trainers. O HHWO soma a isso o poder do coletivo.

  • Experiência diferenciada: não é “mais uma aula de funcional”. É uma vivência cultural e comunitária que faz as participantes voltarem.

🖤 O mercado e o potencial de consumo negro

O Brasil é hoje o segundo maior mercado de academias do mundo, com mais de 31 mil estabelecimentos, atrás apenas dos Estados Unidos (IHRSA, 2023). Ainda assim, só 9% da população brasileira frequenta academias regularmente. Isto mostra que há uma grande fatia da população que busca alternativas fora do modelo tradicional, como caminhada, ciclismo, dança ou esportes como futebol.

E aqui entra um ponto essencial: o público negro como consumidor. De acordo com o estudo Empreendedorismo Negro no Brasil da PretaHub (2019), 51% dos empreendedores brasileiros são negros. Mesmo enfrentando desigualdades estruturais — como menos acesso a crédito e liderança em apenas 15,6% das empresas paulistas (Indique Uma Preta) —, este público movimenta setores inteiros. Iniciativas como o Programa Viver de Tranças, a Casa das Kapulanas ou a AfroSaúde (Nubank, 2022; Forbes, 2021) mostram que, quando representados, consumidores negros respondem com engajamento e fidelidade.

Além disto, segundo a Associação Brasileira de Startups (2022), apenas 5,8% das startups brasileiras são lideradas por pessoas negras, o que evidencia não a falta de interesse, mas sim a lacuna de oportunidades. É justamente nesse espaço pouco explorado que iniciativas como o HHWO encontram força. Em um artigo recente, a McKinsey destaca que marcas que direcionam sua mensagem, produtos e alcance para grupos historicamente negligenciados, como consumidores negros, conseguem criar vínculos emocionais mais profundos e ampliar sua base de mercado, ao atender necessidades e aspirações que ainda não são contempladas.

📖 Leia mais aqui (em inglês)

🤔 O que fica para pensar

Claro que há desafios: depender de eventos presenciais, ter alcance geográfico limitado, lidar com o clima e a sazonalidade. No entanto, cada edição renova a proposta com música, convidados e empreendedores locais. Não é só uma aula: é uma vivência cultural que se multiplica em rede.

E eu fico pensando: 

  1. Quantas empresas ainda ignoram o potencial desse público? 

  2. Quantos serviços poderiam se transformar em experiências únicas se fossem redesenhados para criar pertencimento? 

  3. E, principalmente, quais elementos da sua própria história poderiam ser a chave para falar com pessoas que ainda não se sentem representadas no mercado?

No fim, o Hip Hop Workout mostra que até em setores saturados ainda há espaço para inovação quando se cruza cultura, identidade e comunidade. É fitness, mas também é consumo, afeto e futuro de mercado.

📊 Enquete rápida

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Até daqui 2 semanas,

Prof. Clara

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🏫 Como usar em sala de aula

No semestre passado, no meu grupo de marketing, transformei a avaliação final em uma experiência autêntica: em vez de uma prova tradicional, os alunos receberam o desafio de aplicar os conceitos que aprendemos em aula, como personalização, marketing de escassez e colaboração, a uma empresa real.

A escolhida foi a Pudinzeira, o negócio de sobremesas da Juliana Teixeira, que trabalha na área de operações da escola e com quem os alunos falam com frequência no dia a dia. Isto trouxe ainda mais engajamento, pois eles conheciam a Juliana pessoalmente e sabiam que suas ideias poderiam ter impacto de verdade.

Cada grupo precisou desenvolver uma estratégia para aumentar as vendas de Páscoa da Pudinzeira, apresentando propostas criativas e fundamentadas nos conceitos de marketing. O resultado foi muito rico: desde sugestões de embalagens temáticas e kits especiais, até parcerias com outros pequenos negócios e planos de divulgação no Instagram.

Depois das apresentações, compilei todas as ideias em um relatório estruturado e entreguei à Juliana, para que ela pudesse realmente aproveitar o trabalho dos alunos. E este detalhe fez toda a diferença: nos feedbacks de fim de semestre, todos os estudantes comentaram o quanto foi marcante aplicar o que aprenderam em sala em um negócio real de alguém que eles conhecem e respeitam.

Além de consolidar a aprendizagem de marketing, a atividade mostrou na prática como a escola pode ser um espaço de impacto social. Dar visibilidade e apoio a uma empreendedora negra como a Juliana é também uma forma de impulsionar o empreendedorismo negro e conectar teoria, prática e propósito em uma mesma experiência.

 Com o sucesso desta atividade, algumas dicas que eu daria:

  • Use negócios reais e próximos dos alunos — a familiaridade aumenta o engajamento.

  • Transforme avaliações em desafios aplicados, não apenas em provas escritas.

  • Entregue os resultados para o empreendedor: isto dá sentido e propósito ao trabalho.

  • Mostre como o exercício impacta também no social.

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